Experiência de marca

· por Rafa Soto
experiencia de marca

Os músicos querem criar ligações com os seus fãs. Os escritores querem criar ligações com os seus leitores. As marcas querem criar ligações com os seus consumidores. Os músicos fazem-no através da música; os escritores com os seus textos. As marcas, através das experiências. Da experiência de marca.

De experiências de marca reais…

Uma experiência de marca é o resultado do contacto com a marca através de qualquer um dos seus pontos de entrada. Dito de outra forma, podemos utilizar qualquer touchpoint da marca para gerar uma experiência de marca positiva.

Num carro, poderíamos ter um guarda-chuva de série engenhosamente integrado na porta. Um grande detalhe, barato e muito inteligente por parte da Skoda. Enquanto utilizadores, sabermos que alguém pensou em ter um guarda-chuva disponível quando saímos do carro e está a chover é muito reconfortante.

Numa marca de chá, poderíamos adicionar frases à etiqueta, como faz a Yogui tea. Mergulhar a saqueta de chá em água quente é um momento de calma. As mensagens das suas etiquetas amplificam esse momento, porque o transformam num momento de introspeção. A avaliar pelas fotografias que partilham no Instagram, as pessoas apreciam.

Yogui Tea

No caso de uma marca de café da Starbucks, pediríamos aos nossos empregados que escrevessem os nomes dos clientes de forma errada para eles terem uma história para contar sobre o seu nome mal escrito ao chegar ao escritório. Bem, na realidade, isto é um mito urbano. Ou, pelo menos, a Starbucks nunca reconheceu que comete erros de propósito par ser insta-friendly. Mas isso seria uma boa experiência de marca, porque levar um copo de café na mão desde o café até ao escritório é um ponto de contacto maravilhoso.

… a experiência de marca fictícia

Se pensasse em estabelecer uma ligação com uma pessoa, como um músico com os seus fãs ou um escritor com os seus leitores, como o faria através de um copo de café?

A mim, ocorrem-me várias ideias. Por exemplo, um copo com um código QR que prevê com algum atrevimento como vai mudar o seu dia a partir do momento em que tomar o café. Ou um copo reutilizável com uma etiqueta NFC. Quando o copo estivesse cheio e o aproximasse do seu telemóvel, enchê-lo-ia de inspiração. Se lhe parecer ficção-científica, pense que os chips NFC são cada vez mais baratos e já custam menos de 20 cêntimos. E os códigos QR, desde a pandemia, são a nova normalidade.

Por isso é tão importante considerar a embalagem como uma das suas melhores ferramentas para oferecer uma experiência de marca inesquecível. A tecnologia pode ser um excelente recurso para dar profundidade à experiência, mas a própria embalagem pode ser parte integrante da experiência em si. A KFC transformou os seus baldes de frango frito em baldes perfurados e decorados com figuras de contos. Ao colocar a embalagem por cima do telemóvel com a lanterna acesa, a divisão ilumina-se, e ouve-se uma história através de uma App. A intenção da marca, de querer continuar a ser útil para a família depois de terminada a refeição, é maravilhosa. E é, no fundo, a filosofia da experiência de marca: poder ser importante para as pessoas no dia a dia.

O «retailtainment»

As marcas de retalho têm cada vez mais consciência disso. O comércio de retalho pretende transformar-se cada vez mais numa experiência, quer seja física ou virtual. E se ambos os canais estiverem harmonizados, tanto melhor. O ponto de venda é um dos melhores touchpoints para oferecer uma experiência de marca imersiva. Assim, o «retailtainment» faz cada vez mais sentido quando percebemos que no ponto de venda são tomadas muitas decisões de compra, ainda que não se materializem nesse instante nem nesse canal.

A House of Vans de Londres, por exemplo, tem capacidade para 850 pessoas. Dispõe de dois skate parks indoors, de um café, uma galeria de arte e um auditório. Obviamente, um espaço deste género não foi concebido apenas para as pessoas comprarem. No entanto, vai gerar muito mais compras, porque cria uma comunidade grande e fiel à marca.

Ainda que uma flagship store seja o cenário ideal para criar uma experiência de marca inesquecível, também podemos oferecer algo memorável mesmo que só tenhamos um corner. Há uns anos, a Canada Goose, uma marca de roupa técnica de inverno, instalou uma câmara fria a -32 graus para os clientes experimentarem as suas parkas. Não acredito que haja alguém que tenha experimentado e não tenha contado a experiência a seguir.

Canada Goose cámara fría

Como diz Cathy Sparks, vice-presidente da Global Stores da Nike: “Retail is not dead, but boring retail is dead”. Eu concordo e até iria mais longe. Vivemos numa sociedade que exige muita proatividade por parte das marcas. Ou as marcas são protagonistas das suas comunidades e propõem boas experiências de marca, produto ou serviços, ou acabarão por deixar de fazer sentido.

A oportunidade do produto

Porque o produto é outro dos touchpoints importantes para oferecer uma experiência de marca que faça a diferença. Para além de ter uma função, o produto pode criar uma experiência adicional que, inclusivamente, esteja acima da própria função do produto. Gosto muito do caso da Peloton, por exemplo. A Peloton, para quem não conhece, é uma bicicleta estática ligada a um ecrã através do qual podemos fazer aulas de spinning, corridas com os amigos ou percorrer itinerários por alguns dos caminhos mais emblemáticos do mundo. Uma resposta perfeita à pergunta de como podemos melhorar a experiência de produto de uma bicicleta estática. Parece algo absolutamente diferente, mas é «apenas» uma bicicleta estática. Um produto que já existia, mas com uma camada de experiência adicional que o redefine totalmente.

A Peloton é uma marca que cumpre o que para nós, na Summa, são as quatro dimensões que todas as marcas deveriam ter. Uma identidade bem definida com um propósito forte, uma experiência de marca importante para as pessoas, uma comunidade interessada e que cresce à volta daquilo que oferecemos, assim como uma ambição inovadora que vai adaptando a experiência de marca às expectativas dos consumidores.

De consumidores a utilizadores

Porém, é importante ter em conta que as comunidades das marcas, que são um dos seus principais ativos, raramente surgem de forma espontânea. Pense na Vans, na Yogui Tea ou na Peloton mencionadas acima. Ou na marca de café que não existe e que enche o seu telemóvel de inspiração quando os aproxima. Trata-se quase sempre de marcas com um propósito bem definido, que inovam para oferecer experiências de marca que se tornam importantes na vida das pessoas.

E, voltando ao princípio, essa generosidade, essa ambição de algumas marcas de oferecer coisas importantes aos seus consumidores, faz-me pensar muito na mesma energia com que os escritores e grupos de música querem fazer coisas que valham a pena para os seus seguidores.

Aliás, acabo de lhes chamar consumidores, mas se chamar «utilizadores» aos seus consumidores, ser-lhe-á muito mais fácil imaginá-los a utilizar a sua marca através de várias experiências, ao invés de apenas comprar.
Ebook Requisitos Estratégia de marca - Summa Branding

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